12 de março de 2009

"mas isso não é uma chuva, é o verdadeiro dilúvio! é a barbárie!"


A beleza feminina estreou de fato com Cleópatra, após sugestões na mitologia grega, como Helena, Afrodite. Depois desapareceu, por longos séculos. Os trovadores da Idade Média faziam cantigas a mulheres idealizadas porque as terrenas eram feias, gordas, suadas, não gostavam de bater nem de apanhar. Felizmente, a beleza feminina teve sua reestréia no final do séc. XIX, com a publicação de Salomé, por Oscar Wilde, e foi aos poucos sendo reafirmada com sua exibição nos teatros europeus. Alguns críticos e oficiais estavam furiosos e censuraram as primeiras tentativas de encenação do espetáculo, acusando que "The world is not ready for this, Mr.!". O que logo foi contido com risinhos abafados e com a vibração dos homens que, há séculos, não sabiam mais o que significava um bom tapa na cara.

Depois durou até 1946, com a primeira exibição de Gilda nos cinemas, quando atingiu seu ápice. Daí pra frente, só desastre. Não restou opção aos homens senão virarem gays. Em 1990, após seguidas reuniões com filósofos e arqueólogos, a ONU reconheceu a decadência feminina e removeu o termo "homossexualismo" da lista de doenças mentais, proporcionando uma nova opção para os homens. As portas para o novo século estavam se abrindo. A extinção da beleza feminina foi, então, oficializada em 1998, com a primeira exibição de Sex and the City.

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Inteligência e escrita têm alguns objetivos em comum: provocação de suspiros alheios, prazer próprio e sublimação estilística. Quem pensa ou escreve fora disso não está pensando, não está escrevendo.

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Quando estamos no colegial, normalmente temos 2 ou 3 amigos que são uma espécie de conexão com o mundo real, c'est-à-dire escândalos das meninas grávidas, disputas nos jogos esportivos, garotos cheirando lança-perfume no banheiro da escola, etc. Ao sair do mundo escolar, perdemos contato com esses amigos que eram nossas conexões com o mundo real e passamos a comprar nós mesmos coca-cola na cantina. Ok.

Hoje, encontrei um desses rapazes com quem eu conversava entre as aulas de química e física. Por acaso, estava saindo da cantina. Ele me abordou e quase contou alguma novidade sobre alguém dos tempos de colégio. Foi nessa hora que eu percebi o verdadeiro sentido da palavra elegância - além de aprender a ter memória ruim, claro -: é saber contornar e fugir imediatamente antes que esse assunto comece. Mesmo que se dê uma razão infantil ou faça gestos infantis para fugir, ainda é mais elegante que ficar sabendo que o fulaninho que não lhe aceitava nos grupos hoje faz Direito numa faculdade de segunda e vai ser pai ou que fulaninha engordou e hoje é vendedora da c&a. Se eu fosse um personagem da mitologia grega, seria o minotauro, sem saber esse tipo de novidade, removido em meu labirinto e a matar os homens que vêm me visitar. Eu só trocaria o labirinto por alguma mansão chique. Em Praga. Caso não fosse possível, pintaria as paredes do labirinto de vinho e as decoraria com livros da Cosacnaify. Enfim.

11 de março de 2009

horácio

Horácio não era um chatinho. Só queria seu bem. Imagino-o meio carequinha praguejando por Roma, pra cima e pra baixo, reclamando disso e daquilo, como eu também posso fazer - se não faço tão bem é porque meu latim não é bom e porque não moro em Roma. E porque as togas saíram de moda, coisa que não entendo. Mas ele queria seu bem, como eu também quero. Se Horácio tivesse visto uma foto de um garoto de boné nos anos 90, teria escrito em seu blog algo pesado, irônico e normativo. Virgílio seria o primeiro a comentar o post. Mas, em sua cama, sozinho, ele lamentava. Pobre homem. Pobre Horácio.

10 de março de 2009

caricaturas literatas do Ocidente

21 anos, existencialismo, angústia, marxismo. Homem, branco, gay. Estuda francês. Adora debater sobre o "nada". Enche a boca pra falar "desterritorialização". Gosta de Pasolini.

25 anos, mulher. Bronzeada, luzes no cabelo. Autores preferidos: Florbela Espanca, Cecília Meireles. Gosta de MPB. Faz História ou Filosofia. É anti-sexista. Sagitariana. Gosta de cachaça. Defende o sexo livre, faz esforços para transar.

53 anos, homem. Adora falar sobre política: diz-se "de direita". Usa boina e tem um jeito meio Vinícius de Moraes de ser. Bebe cerveja aos domingos. Adora Fernando Pessoa. Lê o jornal. Usa a internet só para pornografia. Não sabe inglês. Não lava as partes íntimas.

27 anos, mulher, branca, paulista. Tatuagens pelo corpo. Estudante de Jornalismo. Fala coisas como "tô piradaça, cara". Gosta de Hilda Hilst, de Ana Cristina César e de literatura beat. Amarra lenços ao pescoço. Usa drogas.

29 anos, homem e gordo. Diz-se elegante, mas cobre a careca com os poucos cabelos que tem. Gosta de filmes com a Audrey Hepburn. Orgulha-se, de uma forma meio esquisita, de ser tarado e põe fotos de mulheres semi-nuas em cadernos. Gosta de Olavo de Carvalho. Fez o colegial nos Estados Unidos. Hoje, juiz, mora em Brasília.

19 anos, mulher, branca, aparência jovial. Gosta de Lolita e de filmes do Hitchcock. E do Woody Allen. Loira. Lê por distração, sonha em ser atriz. Usa batom vermelho. Entra com nicks insinuantes em salas de bate-papo anônimas. Exibe-se na webcam.

17 anos, homem, cabelos arrepiados e frisados. Nerd. Gosta do romantismo inglês e despreza os professores de literatura do ensino médio. Lê blogs, no anonimato. Mora com a mãe divorciada. Gosta de línguas mortas. Gosta de Poe. E de Mozart.

57 anos, magra, firme. Cabelos lisos e tingidos de ruivo escuro. Roupas igualmente escuras. Usa scarpin. Professora de Literatura francesa. Pálida, viúva. Fumante. Ama Flaubert. Não atende celulares em sala. Não repete a bolsa. Não tem orkut, não lê blogs.

a melhor forma de argumentar (2)

a melhor forma de argumentar

9 de março de 2009

these lips will find strawberry wine

Existe coisa mais caricata que ser um defensor do rock? A pessoa que gosta de rock, em algum ponto dos finais do séc. XX, passou a ser tida como uma caricatura tão definida como, até uns anos antes disso, os tiozões que gostavam de jazz ou os adolescentes entusiastas de Mozart. O que, aliás, não mudou muito - não consigo pensar em tipos mais caricatos no mundo da música (se bem que, o que sobrou? Clubbers? Gente do reggae?).

Porém, o rock tinha dessa coisa jovial e transgessora de estilos que, levada ao extremo, acredito, tenha seduzido os adolescentes dos finais do séc. XX e começos do XXI a rejeitarem o confortável veludo do cânone do rock (David Bowie? Beatles?) e a se enveredarem por bandas obscuras suecas ou mulheres de cabelo suspeitável. (Isso enquanto acompanhavam, inconscientemente, todo o apego mundial pela destruição do cânone, né. Ou melhor, da sua transformação ou inversão: o cânone virou a maior distância que possuía do seu antigo centro com uma desculpa boba de que o cenário estava descentralizado. Mas como gostar de uma coisa sem um ponto de referência?) (Olhar profundo). No entanto, essa tentativa acabou por desagüar numa outra caricatura. E seu lugar-comum domina os palcos da MTV e indies paulistas.

Enfim, eu não queria escrever sobre nada disso. Apenas estava ouvindo uns eps do My Bloody Valentine e me deu vontade de escrever sobre sem parecer que eu queria falar que sou "um resíduo da era shoegazer" ou que sou sujinho ou que tenho piercings. Deixo claro: vou uma vez por mês ao cabeleireiro, corto as unhas, uso uns sabonetes especiais para as mãos. É preciso lutar contra os calos que a musculação quer me dar. E ontem comprei dois pares de sapato. A eles, escreverei um longo post em seguida.

8 de março de 2009

li hoje na revista Boa Forma: cintura fina, braços desenhados e "adeus, ansiedade"

Não se lê um livro da Cosacnaify. É uma ofensa às folhas. Andar com qualquer livro da Cosacnaify pelo meio da rua é como passear tranqüilamente com um vaso chinês da Era Ming pelas calçadas da República Dominicana. Que edições bonitas. E é que nunca sequer reparei exatamente o que eles publicam, excetuando uma coleção de mulheres modernistas da qual eu só conhecia uns 2 ou 3 nomes. O que pouco importa. Tenho vontade de comprá-la para colocar na sala, ao lado de garrafas de whisky e álbuns de fotografia.

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Todos estão fingindo, mas geminianos sabem que estão.

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Meu problema com Antonio Candido é simples: ele não sabe escrever. Eu aceitar ler Antonio Candido é como eu aceitar ouvir Aviões do Forró e não Maysa. Ou não falam sobre a mesma coisa? No que não há mal nenhum, não há muito sobre o que falar. Se alguém me diz que gosta de Antonio Candido, sei que também pode gostar de Aviões do Forró. Etc.

O problema dessa classe que não se importa com as minúcias de estilo é que eles põem tudo no mesmo caldeirão. Tudo. E ainda fazem as classificações de acordo com o pouco vocabulário que têm. Olham, por exemplo, Kafka, aquele estilo meio troncho, a aura sombria, o cabelo tiririca e pensam: "emo". Devolvem o livro à estante e pegam o novo da Fernanda Young. Não sei, viu, algo me diz que é por causa dessa gente que Kafka ordenou que queimassem seus escritos.

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Sei que estou desatualizado em videogames quando descubro que Final Fantasy já está na sua 13ª edição. Que raios. Nessas horas eu insisto pra lembrar o que eu fiz de tão importante nessas últimas férias que não liguei meu playstation nem escrevi aqui. Nesse jogo novo da Sony, Flower, controla-se uma pétala pelo ar. A idéia, pelo visto, é se aproximar de outras flores, colhendo-as e assim fazer uma espécie de dança de pétalas. E outras coisas do enredo, puzzles, tal. A verdade é que a Sony tem bom gosto para jogos. Um que eu adorava aos 13 ou 14 era Ico (aqui a review do IGN). Mas, voltando ao Flower, isn't it lovely? Quanto estará custando um Playstation 3?

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E pra fechar esse domingão do faustão:

Twenty-four years remind the tears of my eyes.
(Bury the dead for fear that they walk to the grave in labour.)
In the groin of the natural doorway I crouched like a tailor
Sewing a shroud for a journey
By the light of the meat-eating sun.
Dressed to die, the sensual strut begun,
With my red veins full of money,
In the final direction of the elementary town
I advance as long as forever is.


(Dylan Thomas)

a arte da atuação

Por 90% do tempo, ajo como se houvesse uma câmera me filmando. Imagino os ângulos e enquadramentos. Não é por acaso que adoro ambientes espelhados. Ali posso dizer "Hmm, mais trágico!" ou "Mais sério!".

Nos outros 10%, se me coloco fora desse grande filme, ainda imagino uma câmera escondida fazendo o making of. Temo um torcicolo em breve.

2 de março de 2009